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Conquistar o Oeste para não perder o Norte


 

No Norte já pacificado após a Guerra de Porecatu, esboça-se em outubro de 1952 um movimento que “começava a tomar forma e cores”, segundo o jornal Folha de Londrina, pretendendo criar um Estado independente do Paraná, sob a inspiração do movimento separatista do Triângulo Mineiro.

Desde que o Paraná se emancipou de São Paulo, um século antes, em 1853, os interesses paulistas no Norte do Paraná continuaram considerando a região como seu território. 

As batalhas entre jagunços de latifundiários paulistas expulsando posseiros do interior do Paraná, como em Porecatu, continuaram também por todo o século XX, tendo como focos o café, a madeira e a posse da terra.  

As lideranças paranaenses ficaram traumatizadas em 1916, com a derrota de seu advogado, o baiano Ruy Barbosa, na questão do Contestado. O desfecho foi o Paraná perder seu Sudoeste para Santa Catarina, deixando assim de ter limites com o Rio Grande do Sul. 

Aliás, o interior gaúcho foi colonizado por sertanistas do Paraná, cujas famílias de descendentes ficaram lá, conhecidas como “birivas”, mas em geral os historiadores os mencionam sobretudo como paulistas, porque o Paraná até 1953 foi a Quinta Comarca de São Paulo.

O trauma da perda de 1916 aumentou em 1943, com a criação do Território Federal do Iguaçu. Mesmo vencendo o TFI na Constituinte de 1946, até meados da década de 1950 havia poderosos interesses paulistas no Norte do Paraná pregando a anexação da região a São Paulo ou a criação de um novo Estado, separado do Sul.

Tentativas de separação

Os fazendeiros do Sudoeste, desde a formação de Palmas, tinham interesse no fortalecimento do Paraná e a conquista do Oeste sempre foi apoiada pelas lideranças curitibanas. 

A ideia de abandono por parte de Curitiba foi sempre alimentada por interesses separatistas que pretendiam na primeira metade do século XX a anexação do Norte e Noroeste do Paraná a São Paulo e na segunda metade a criação do Estado do Iguaçu.  

No início da década de 1950, nesse caso, cresceu a campanha pela separação do Norte do Paraná, especialmente em lugares do Norte Novo dominados por interesses paulistas determinados a exportar por meio do Porto de Santos.

Seria o “Estado Paraná do Norte” ou “Estado do Paranapanema”. A primeira proposta foi logo esvaziada pela ação do governo Munhoz da Rocha, mas a segunda ganha eco toda vez que Londrina ou Maringá tem alguma reivindicação não atendida pelo governo do Estado.

Em Maringá, o grande defensor do Paranapanema era o bispo Jaime Luiz Coelho, dono do jornal Folha do Norte do Paraná, mas não foi convincente. Já as principais lideranças londrinenses nunca se deixaram contaminar pelo separatismo. 

Confiavam no governo estadual, novamente empalmado pelo grupo Camargo-Rocha, que controlou o Paraná antes da Revolução de 1930 e voltou a reinar nas eleições de 1950. 

O sucesso de seus empreendimentos não se devia a inexistentes benefícios vindos de São Paulo, mas aos negócios com as comunidades da própria região e pelo avanço da integração entre os três Paranás: o antigo, entre os Campos Gerais e o litoral, o Norte Novo e o Oeste/Sudoeste. 

Foco em Paranaguá

Na vitoriosa campanha eleitoral de 1950 e após a posse, o governador Bento Munhoz da Rocha garantiu a melhora das vias de transporte para que a produção agrícola do Norte fosse prioritariamente escoada pelo Porto de Paranaguá. 

“É justo que queiramos que o café paranaense se escoe pelo porto de Paranaguá”, defende Munhoz da Rocha em artigo intitulado O café é o nosso sangue. “O governo do Paraná tem trabalhado e agido dentro dessa diretriz” (em Revista do Café, Londrina).

De um lado, o pai de Bento, o ex-governador Caetano Munhoz, foi um dos artífices do Porto de Paranaguá. De outro, desde 1935 já estava esboçado o plano de integrar os três Paranás. A expressão concreta desse projeto foi a Rodovia do Cerne.  

“O engenheiro Luiz Carlos Pereira Tourinho, então secretário de Obras Públicas, elaborou um novo projeto, semelhante ao do governo anterior, visando a capitanear a produção agrícola das regiões interioranas para o Porto de Paranaguá” (Elzio dos Reis Marson, No Limiar do Horizonte: Manifestações e Discursos Divisionistas Norte/Sul e Política Integracionista no Paraná).

A grande produção esperada pelo governador Bento Munhoz também contemplava apoio ao Oeste e do Sudoeste, em ativa construção, onde a madeira já recebia prognósticos de rápido esgotamento do ciclo, cabendo ao planejamento do Estado projetar um futuro agropecuário a partir do café.

O êxodo ao Oeste

O Paraná ainda produzia pouca soja: em 1952, a safra do feijão oriental se limitava a escassas 43 toneladas. Já crescia a olhos vistos, porém, o êxodo de colonos que migravam do Rio Grande do Sul e Santa Catarina à região. 

“São 30 a 40 mudanças por dia entre 1952 e 1955”, avaliou o médico gaúcho Walter Alberto Pecoits (1917–2004), instalado em Francisco Beltrão desde 1947. Era de fato um êxodo, mas nunca espontâneo, como alguns consideram erroneamente.

Hylo Bresolin (1932–2016), que presidiu a Acic e fundou a Caciopar, testemunhou o interesse de sua família pelo Oeste do Paraná pela propaganda feita pelos corretores das colonizadoras. Eles contavam maravilhas que diziam haver no Oeste paranaense: terra plana e extensa era música nos ouvidos de famílias minifundiárias.

Ainda antes da colonização da Santa Helena Velha, no início do século XX, o menino Sandálio dos Santos disse que decidiu vir ao Alto Paraná justamente por ouvir histórias sobre as riquezas que corriam na região, na época ainda controlada pelos obrageros argentinos.   

As políticas do Estado do Paraná de oferta das terras devolutas aos posseiros e a propaganda das colonizadoras para atrair colonos com ótimas ofertas de trocar produção e trabalho por terras deram origem do fenômeno.

Os colonos vinham do Sul previamente motivados e com noções bem claras das áreas nas quais seria melhor se instalar.

O migrante catarinense Otávio Borges, ao decidir partir rumo ao Oeste paranaense, já estava ciente de que poderia custear uma bela chácara com produção e serviços. Veio com paradeiro certo e financiou o transporte da mudança para a casa que construiu com uma lata de banha. 

“O pagamento de trabalhos com produtos ou a simples troca para atender as necessidades eram comuns, já que o dinheiro era muito raro” (Helio Pomorski e Neusa Benatti, São Miguel do Iguaçu, Estórias e História). 

Dificuldades e jagunços

Borges chegou sozinho à área da Colonizadora Gaúcha, mas já estava com 32 anos, casado com Virgínia Moro, filha de italianos de Padova. Hospedado pelo compadre Josué Fabris, preparou a casa para a qual iria trazer a família enquanto cultivava a primeira safra de arroz.

Enfrentou os perigos da mata viagem desbravada e as ameaças dos jagunços, até conseguir se impor também no núcleo urbano da futura São Miguel do Iguaçu no ofício de barbeiro. 

Desde a partida de sua cidade natal, Meleiro, no Sudeste catarinense, até o período em que trabalhou formando lavoura, construindo casa e preparando a vinda da família, ele tinha cada passo planejado. 

Muitas famílias sulinas, igualmente sugestionadas a migrar, só destinaram as economias de uma vida inteira adquirindo terras no Paraná com informações confiáveis de que teriam apoio. Assim, as colonizadoras faziam rapidamente ótimos negócios. 

Algumas, garantidas pelo poder político e cartorial, lucravam também expulsando posseiros e comercializando suas terras com os que chegavam. Borges também viu isso, mas não desistiu, ao contrário de colonos que tentaram a vida na futura Santa Terezinha de Itaipu.

“Havia 60 posseiros. A (colonizadora) Criciúma botou para fora da terra 59. Só sobrou eu. O Bernardino Velho, um ex-sargento do Exército que trabalhou na abertura da Estrada Estratégica e que tinha aqui uma posse com autorização do chefe da Colônia Militar, acabou sendo expulso daqui. (...) Botaram ele pra fora e queimaram a casa onde morava” (Leonardo Wychosky, depoimento ao jornal Nosso Tempo, de Foz do Iguaçu).

A estratégia de criar municípios  

Novos projetos de colonização no Oeste começam a se desenvolver em 1952, como o de Palotina, que iria trazer muito conflito, desta vez entre os compradores sulistas e o governo do Paraná.

A caravana pioneira que vem para iniciar Palotina sai de Concórdia (SC) formada por uma camioneta, um automóvel e um caminhão Chevrolet Tigre. A iniciativa é do ousado farmacêutico Abud Dequech que, dentre outras proezas, já havia fundado a cidade paranaense de Assaí e a catarinense Ipumirim.

O ponto-chave da estratégia de Bento Munhoz de integrar o Paraná foi repetir a criação de dezenas de municípios ao mesmo tempo, já encetada com sucesso por Moysés Lupion. Foi a que Lupion, nome apenas conhecido no Estado, projetou-se nacionalmente, atuando ao Congresso Nacional.  

A instalação dos novos municípios se deu no fim de 1952, dentre os quais meras vilas cujas populações, ainda que somadas, não superavam na época qualquer bairro de Maringá ou Londrina.

No Oeste e Sudoeste foram criados os municípios de Cascavel, Toledo, Guaraniaçu, Guaíra, Barracão, Capanema, Francisco Beltrão, Pato Branco e Santo Antônio, cada qual com distritos a ser preparados para também se tornar novos municípios.

Mesmo com um perímetro urbano composto por apenas 27 casas, Cascavel era um município muito amplo, limitado ao Norte pelo Rio Piquiri e ao Sul pelo Iguaçu. A Oeste, Foz do Iguaçu. A Leste, Campo Mourão e Guaraniaçu.

Monteiro, evidência do planejamento   

A pequena vila com nome de serpente, depois de já ter sido também cogitada para capital do Território Federal do Iguaçu, em 1943, vai receber logo em seus primeiros dias de existência municipal um hóspede que dentro de alguns anos terá criado as belezas estampadas em seus melhores cartões postais: a Avenida Brasil e a Catedral.

O arquiteto Gustavo Gama Monteiro (1925–2005), enviado pelo presidente da Fundação Paranaense de Colonização e Imigração, Djalma Rocha Al Chuery, chega para comunicar às autoridades locais sua missão: iniciar um ambicioso plano de colonização dirigido pelo poder público na “Colônia A”, cujas terras fertilíssimas são banhadas pelos rios Tourinho, Melissa e Piquiri.

A primeira parte do projeto consiste em promover a locação das glebas, “levantando-se os espigões e os rios, para se parcelar a terra em lotes de 200 ha ou 80 alqueires, visando desenvolver nesses locais fazendas de café” (Rubens Nascimento, Histórias Venenosas).

A segunda parte seria criar uma metrópole planejada no sertão: a Cidade Munhoz da Rocha. A presença de Monteiro, pelo conjunto de suas atividades, comprovou a ação objetiva do governo do Paraná no Oeste. 

Havia dificuldades e carências, além da crise nacional, mas o “abandono” por parte do Estado que os separatistas do Estado de Paranapanema propagavam foi exagerado pelos interesses em jogo.

Fonte: https://pretonobranco.com.br/noticia/74092/conquistar-o-oeste-para-nao-perder-o-norte

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